Recurso Penal – Sujeitos Processuais Afetados pelo Recurso

Questão colocada em 10.Jul.2012

QUESTÃO (102):

TRAMITAÇÃO DE RECURSO PROCESSO PENAL:

Interposto recurso de uma sentença, em que figuram como sujeitos processuais o MP, um Assistente e 3 arguidos, todos os arguidos condenados, só um deles veio a interpor recurso da sentença proferida.

PERGUNTA-SE:

Com vista ao cumprimento do n.º 6 do art.º 411.º do CPP, quais os sujeitos processuais que a secretaria deve ter em conta como afetados pelo recurso, tendo em vista a sua notificação e apresentação das respetivas respostas ou decorrido o respetivo prazo, por falta delas ?

RESPOSTA:

I - ENQUADRAMENTO

Na redação dada ao art.º 411.º do Código de Processo Penal, antes das alterações introduzidas pela Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto, não se mostrava prevista a regra da oficiosidade de notificação da motivação, antes mesmo do despacho de admissão do recurso.

Com efeito, só depois de admitido o recurso, se procedia à notificação dos sujeitos processuais afetados pelo mesmo, tendo em vista a apresentação da resposta, sendo os restantes (não recorrentes) notificados do despacho que admitiu o recurso, a fim de tomarem conhecimento deste.

A reforma do processo penal introduzida pela Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto, veio a proceder a uma alteração substancial na tramitação unitária dos recursos, introduzindo-se a regra da oficiosidade que impõe à secretaria a notificação dos sujeitos processuais afetados pelo recurso, antes mesmo da sua admissão, para responderem, querendo (cfr. n.º 6 do art.º 411.º CPP) e só depois de apresentadas as respostas ou decorrido o respetivo prazo, o processo será concluso ao juiz para o despacho de admissão, nos termos do art.º 414.º do CPP.

Face à nova tramitação dos recursos penais coloca-se, na esfera da secretaria, a análise sobre a identificação dos sujeitos processuais que se mostrem concretamente afetados pelo recurso.

Perante tal circunstancialismo entendemos o seguinte:

  1. se o recurso é interposto pelo MP, devem ser notificados todos os arguidos e assistentes.
  2. Se interposto pelo assistente notificam-se todos os arguidos e o MP (em relação ao MP, enquanto titular da ação penal e em defesa da legalidade - art.ºs 48.º a 53.º do CPP).
  3. Se dos vários arguidos condenados, apenas um interpõe recurso, a secção, oficiosamente, notifica o MP e o assistente, para responderem, nos termos do art.º 411.º, n.º 6 do CPP.
  4. Os arguidos não recorrentes devem ser notificados do despacho de admissão do recurso, para que tenham dele conhecimento.

Todos os arguidos, em caso de condenação, têm legitimidade para interpor recurso se entenderem estar afetados pela decisão. Não recorrendo estes da decisão, deve entender-se que não tiveram necessidade de fazer prosseguir o processo e de que se contentam com a decisão proferida.

A conformação com a decisão é sinal de que os arguidos, não recorrentes, não necessitaram do recurso para fazer valer os seus direitos processuais, isto é, não tiveram interesse em agir ou interesse processual.

Ao considerar-se como sujeitos processuais afetados, os coarguidos não recorrentes, pelo recurso interposto por só um deles, ficar-se-ia na dependência de um prazo que se teria que aguardar para uma resposta, que não será admissível, pelo facto de não podermos considerar, nestes termos, os coarguidos, não recorrentes, como sujeitos processuais na posição de “recorridos”.

Contudo, poderão ser afetados, em consequência do recurso interposto, se o tribunal superior se decidir pela anulação do julgamento, mas aí tudo volta ao início, havendo nova evolução para o trânsito em julgado.

A este propósito, os Autores Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal – 6.ª edição de 2007, colocam a questão, a propósito do alcance do princípio da proibição da reformatio in pejus, designadamente das suas consequências processuais, que ultrapassam as situações de comparticipação, resultantes da conexão ou autoria paralela, e em relação ao próprio arguido recorrente.

Basta considerar o caso em que o arguido é o único recorrente e vê, como pediu, anulado em recurso o julgamento da 1.ª instância. O novo julgamento abrange os restantes coarguidos não recorrentes? E a sentença pode aplicar penas mais graves do que as infligidas no seguimento do julgamento anulado?

Segundo os autores, esta questão já foi objeto da atenção da doutrina e da Jurisprudência Tribunal Constitucional e do Supremo Tribunal de Justiça.

Assim, por decisão do Tribunal Constitucional, foi julgada inconstitucional, por violação do artigo 32.º, n.º 1 da Constituição, a norma do artigo 409.º, n.º 1 do CPP, interpretada no sentido de não proibir o agravamento da condenação em novo julgamento a que se procedeu por o primeiro ter sido anulado na sequência de recurso unicamente interposto pelo arguido (Ac. n.º 236/2007 de 07.03.30, Proc. n.º 201/04).

Também o Supremo Tribunal de Justiça no Ac. de 08.07.2003, proc. N.º 2616/03-5) decidiu no seguinte sentido:

- Decorre do princípio da proibição da reformatio in pejus que se em recurso só trazido pelo arguido, for ordenada a devolução do processo, não poderá a instância vir a condenar o recorrente em pena mais grave do que a infligida anteriormente.

II - CONCLUSÃO

Face ao exposto, reforçado pela jurisprudência atrás citada, dificilmente se poderá compreender que os coarguidos, não recorrentes, possam fazer parte do elenco dos sujeitos processuais afetados pelo recurso interposto apenas por um deles, ainda que, devam ser notificados do despacho que admitiu o recurso nos termos do n.º 1 do art.º 414.º do CPP.

Por outro lado, casos existem que, por força da separação do âmbito do recurso, se poderá declarar transitada a sentença para os arguidos/condenados e não recorrentes.


O Departamento de Formação do SFJ

Carlos Caixeiro

Diamantino Pereira

João Virgolino

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